segunda-feira, julho 31, 2006

Acorda, meu amor.
E no entanto os teus olhos estão abertos. O teu cabelo longo espalha-se no gelo vermelho. Frio, muito frio.
Acorda, meu amor.
Não ouves a minha voz? Não sentes o meu beijo? Será que afinal não sou o príncipe encantado que me fizeste acreditar ser?
Acorda, meu amor.
Não fites o vazio com essses olhos despidos de vida. Olha para mim como tantas vezes o fizeste. Quero ver-te olhar para mim como já não o podes fazer.
Acorda, meu amor.
Não sentes o molhado das minhas lágrimas que te lavam a cara? Será possível não ouvires os meus gritos de desespero?
Acorda, meu amor.
Não sinto a tua respiração que tantas vezes senti no meu pescoço e no meu ouvido quando faziamos amor. Não sinto o teu coração que tantas vezes senti no teu peito querendo saltar para o meu.
Acorda, meu amor.
Diz alguma coisa. Faz alguma coisa. Por favor... Por favor...
Acorda, meu amor.
Quero para sempre dormir contigo.

Inspirado por uma das últimas cenas de Could Mountain

domingo, julho 30, 2006

Espantei-me a mim próprio quando me desapercebi de tudo o que me rodeava. Num poder sobrehumano consegui ignorar os milhares de watts que pairavam sobre a minha e sobre a cabeça de toda a gente.
Para isso, refugiei-me nalgum canto desconhecido do meu cérebro e mantive-me por lá enquanto soassem os sons do desconhecido. Como é estranho o comportamento humano.
E nesse lugar, lá dentro de mim, descobrem-se coisas que nunca julgava descobrir.
Coisas medonhas. Quem diria que isso existia em mim. Fantasmas. Espíritos. Raiva. Angústia. Tudo isso amarfanhado num canto manhoso.
E de quem é a culpa? Mea culpa. Se os tenho a todos guardados, a culpa é exclusivamente minha. Por não os deixar sair quando devia. Por alimentá-los e os manter em cativeiro. Porque até nisto sou egoísta e não deixo absolutamente ninguém ver o que se passa em mim nas alturas em que algo se passa em mim.
Como queria não ser assim. Depois acabo alheado de tudo num sítio qualquer. É no que dá.

sábado, julho 29, 2006

No reflexo do ondular do teu cabelo vejo o meu próprio olhar dominado por ti. Perco-me no teu cheiro. O som da tua voz encanta-me.
E no entanto, não estás aqui. Nunca estás tempo suficiente porque não existe tempo para matar a sede que tenho de ti.
E às vezes pergunto-me se não seria mais fácil se não sentisse falta de estar perto do teu perfume, estar perto do som da tua voz e do ondular do teu cabelo.
Porque perto e longe não passam afinal de relativismos impostos pelo desejo de cada um em função da capacidade de deslocação. E o próprio relativismo é relativo e depende de quem o sente.
E de absoluto só existe afinal aquilo que cria o relativismo.
De absoluto, só as ondas do teu cabelo. De absoluto, só o som da tua voz. De absoluto, só o teu cheiro.
Nem o vodka existe de mais absoluto.

sexta-feira, julho 28, 2006

Juro ser capaz de ver pedaços de mim a serem levados, pelo rio que abraça a minha cidade, em direcção ao mar.
E a cidade vê-me, e nada diz. Nada faz para me impedir de lhe fugir. Ingrata. Mal-amada.
Porque me trata ela assim depois de tantos passeios, de paisagens que levei comigo, de memórias tão felizes quanto marcantes. Porque insiste em me tratar como mais um dos muitos que se confessam apaixonados por ela?
Cidade maldita. Que encantos tens tu afinal para agarrares tantos pobres apaixonados? E que prazer perverso sentes das suas lágrimas quando são forçados a deixarem-te?
O que têm as tuas ruas a mais, que nos fazem querer percorre-las tantas vezes quantas as necessárias para sabermos todos os nomes das lojinhas minúsculas de cor?
E essas pontes de imaginação que te unem ao resto do mundo, porque fascinam elas tantos? Porque são elas motivo de tantas histórias?
Ah!, cidade desgraçada que por ti tantos se desgraçaram!
Sou desgraçado. Amo-te Porto. Verdadeiramente.

Na noite encontro-me. No escuro consigo ver a sombra da minha alma. Apenas no escuro.
No breu tenho a luz para olhar dentro de mim e descobrir quem já lá não contava que estivesse.
Mas está. Nunca saiu de mim aquele que se julgava eu. Aquele que eu próprio confiava ser a minha pessoa.
E era. É. Não completa, mas parte importante de mim. Julgava ter perdido essa parte. Não sabia onde a havia posto, não sabia que tinha ela feito de si própria.
Estava apenas encoberta pelas outras que ganharam mais importância. Mas sempre em mim, esperando ser chamada. Essa parte, esse lado, vejo-o na noite. Vislumbro-o no escuro. Às vezes, muitas, só depois de bastante embebido em alcool. Outras, não tantas, apenas com a força do desejo de encontrar aquele lado contrário ao normal.
O lado não habitual. O lado diferente.
Esse, a que chamam de lado esquerdo, o oposto do direito.
Julgo tê-lo encontrado, finalmente. Reencontrá-lo, se assim preferirem.
O meu lado esquerdo sempre fez parte de mim. Só me esqueço às vezes que está ao lado do direito.
Encontrei o meu lado esquerdo.

quinta-feira, julho 27, 2006

Se um dia me apaixonar por ti, prometes ser verdadeira e ajudar-me a compreender-te? Prometes ser aquela que me ouve com paciência nos meus dias chatos e se entusiasma verdadeiramente nos dias felizes?
É que já estive apaixonado antes. E descobri ser mais o amor do que apenas dar as mãos.
Se eu te der o meu coração, vais adorar amar-me? Se eu também te amar, será que me vais amar mais?
Se eu confiar em ti prometes que não me vais ferir o orgulho?
É que não suportaria a dor se me deixasses. Estaria perdido se o nosso novo amor fosse vazio, em vão.
E espero, então, que percebas que eu te amo.


Livre tradução e adaptação: If I fell, By The Beatles

É nestas alturas que os dias deviam ter 26 horas. Elas não chegam para o que queremos e quando sobram não sobram a quem queremos. Estou ocupado como nunca julguei estar num fim de julho. Mas afinal de contas isso é bom.
O único senão para além do tempo que não tenho, são as ideias, que poderiam ser transformadas em texto, que não existem. Nem sequer a memória me vale.
Assim, do que me estou a lembrar agora (não prometo que seja tudo), este cantinho fez dois anos o mês passado; a minha sunset, com quem não falo há imenso tempo, completou 23 verões; e existe um nós há mais de um ano.
Parabéns aos respectivos. Provavelmente esqueci-me de algo, mas que me perdoem, que já são as tantas da manhã e o cansaço já me está a pesar nos olhos.
Prometo que vou tentar actualizar mais este estaminé.
Obrigado a todos vocês que ainda têm a paciência de ver se isto é actualizado, já não vos agradecia há muito tempo.

sábado, julho 08, 2006

Às vezes gostava de ser escritor. Pôr tudo aquilo que me passa na cabeça por escrito. Só tarde me apercebo que a velocidade dos meus pensamentos é pelo meos mil vezes mais rápida que a da minha mão.
Às vezes gostava de saber escrever. Então pego num caderno e numa caneta ou num lápis e num pedaço de papel ou num teclado, e num esforço oco passo palavras soltas e frases desconexas para o meio físico, corrigível ou virtual.
Gostava de conseguir transformar a minha cabeça num livro. Ou em vários, tal é a amálgama de pedaços de coisas diferentes. Nessas alturas pego nos utensílios de há pouco, em um ou até em todos, sento-me e observo o tecto. Espero nele descobrir aquilol que os ignorantes e os "writer wannabes" chamam inspiração. Escusado será dizer que a existir tal entidade não está escondida num rugoso e branco tecto.
A verdade é que eu sei que essa chamada "inspiração", e aqui estou a fazer aqueles gestos com os dedos como as pessoas que querem indicar as aspas quando estão a falar, não existe. Ou, se existe, nunca me foi apresentada, o que é uma pena, tinha muito gosto em conhecer a senhora, ou menina, que isto do cavalheirismo tem que se lhe diga.
Nesses dias em que escrevo, a única coisa que tenho é isso mesmo: vontade de escrever. Sim, a verdade é que essa vontade a tenho todos os dias, mas nessas jornas em particular sou capaz de passar a tinta, ou a graffiti, ou a bytes, o que na mente me paira.
Digo isto porque nunca me senti inspirado. Já me senti triste: então escrevi. Já me senti alegre e nada passei da minha cabeça. Já me senti desesperado e a caneta levou com as culpas. Talvez seja isso a inspiração: um estado de alma tão deplorável que só escrevendo se alivia.
Não mais quero estar inspirado.