sábado, dezembro 18, 2004

O nervoso miúdinho daquele que se esperava um reencontro emocionado crescia dentro de mim, transformando-se de um simples e pequeno sussurro para um grito lancinante que quase me ensurdecia. Quanto te vi, fingi o contrário. Virei a cabeça, respirei fundo, entrei. Juntei-me ao nosso grupo de sempre e resolvi ignorar-te, transparecendo uma calma mentirosa.
Não resesti. Dei a volta ao grupo de gente amiga para te apanhar de surpresa.Toquei-te para que te voltasses para mim. Sorriste, abraçamo-nos. Fingi birra, imitei-me a mim mesmo em versão zangado. Não consegui lá muito bem, sou péssimo actor.
Ainda faltava muito para o espetáculo começar e fomo-nos entretendo a contar um ao outro as histórias das semanas longe.
A hora aproximava-se, e mais tarde ou mais cedo a música iria começar, privando-nos da agradável conversa durante as próximas horas. Fomo-nos posicionando para uma posição preveligiada de visão do palco.
A luzes baixaram de intensidade e uma voz anunciava os músicos. O espetáculo ia começar.
Uma atrás da outra, as músicas iam rolando. Naquelas mais intimistas, eu abraçava-te o ventre e tu agarravas os meus braços como se tivesses medo que eu te fugisse. Cantávamos em coro com a multidão e com a banda as letras tantas vezes choradas mas eu só te ouvia a ti. Por vezes cheirava o teu cabelo para voltar a sentir o aroma delicioso da paixão. Outras vezes, segurava a minha cabeça nos teus ombros e fechava os olhos para conter uma lágrima de saudade, tristeza e alegria. Trocavamos um ou outro beijo, carinho ou piada nos poucos segundos mortos.
Revivi tudo o que tinhamos passado, todos os outros concertos a que tinhamos assistido de forma idêntica, todos os momentos que passamos juntos. Tudo assomava à minha cabeça como se fosse uma avalanche.
E no fim, mesmo no finzinho, não consegui evitar a estupurada da lágrima na música mais lamechas e popularucha da noite. "Se não te deste a ninguém magoaste alguém".
O concerto acabou, as lembranças acabaram. A esperança resiste, é verdade. Ínfima e escondida, como sempre, sem esperança de ser mais que ela mesmo. O sentimento permanece, envergonhado e calado.
Só a noite acabou. E a mim passou-me ao lado.

Se não te deste a ninguém, magoaste alguém. A mim, secalhar, não me passou ao lado.
Demasiadas memórias, demasiados cheiros, gestos, sentidos. Demasiados toques e abraços saudosos, demasiados beijos de amizade ou paixão, demasiada emoção. A música, a atmosfera, tudo. Tudo se reunia na perfeição para a reunião dos nossos sentimentos díspares. Mas agora... agora não. Não escrevo mais. Estou com sono e pensativo, estou cansado e inspirado. Amanhã... amanhã relembrarei a noite em que relembrei tudo, desde o principio até ao fim, desde a felicidade até à agonia, desde a conformação, passando pela ambição de retorno à conformação. Amanhã falarei de hoje falando de ontem.
Não te deste a ninguém e magoaste alguém. Talvez a mim...

quinta-feira, dezembro 16, 2004

Estou farto de estar sozinho.

sábado, dezembro 04, 2004

Um sorriso conformado de um amanhã melhor tem sido o meu nos últimos tempos. Um sorriso de falsas esperanças com falsa felicidade. Um sorriso vazio de identidade e de razão. Um sorriso que só estava na cara para ser mais cómodo, para mim e para os outros. Um sorriso que prometia um melhor amanhã sem convicção.
No entanto, o amanhã chegou. A falta de identidade do sorriso desapareceu dando lugar a um mais despreocupado, mais verdadeiro e feliz. Agora já não ando por aí sem qualquer vontade de andar, já não ando por aí sem qualquer vontade de voltar a amar. Agora, estou confiante, estou esperançoso e desejoso que o amanhã chegue, me traga novos projectos, novas conquistas e novas paixões. Quero viver mais porque viver é bom. Pode nem sempre ser fácil, às vezes pode até ser incomprensível, mas a verdade é que nas pequenas coisas podemos encontrar felicidade. Em pequenos gestos podemos encontrar prazer. Comer, adormecer são tudo coisas do dia-a-dia que progressivamente fomos aprendendo a desvalorizar. Eu aprendi que quanto mais desiludidos estamos, maior gosto estas pequenas acções nos podem trazer. Sonhar, por exemplo, é uma das mais sublimes formas de estar. Viver noutro mundo e ansiar por algo maior e melhor, ou então, mais pequeno e simples.
Sonhar faz bem, eu gosto de sonhar. Já não sonhava à muito, apenas tinha pequenos pesadelos. Mas agora, volto à vida num sonho.
E sorrio sonhador. Sorrio, porque ainda falta muito para o sonho acabar.

quarta-feira, dezembro 01, 2004

As estações de comboios são dos sítios da terra com mais emoções por metro quadrado. Amor confunde-se com saudade e tristeza, perda e tempo ou até mesmo amizade. O turbilhão de sentidos é tanto que não sei se hei-de chorar ou rir, sorrir ou fitar as linhas e comboios tristemente. Naquela tarde, na tarde em que pude novamente despedir-me de ti sem culpas, senti-me absolutamente perdido, sem rumo num lugar cheio de destinos. Olhava-te nos olhos à procura de uma resposta, de uma dica para o comboio que eu devia apanhar para chegar a algum destino, mas só conseguia ver a sombra de quem tentava amar e não conseguia. Naquela tarde em que te deixei no comboio que rumava para o futuro, pensei em largar tudo, deixar tudo e ir contigo, continuar a pôr em dia a conversa de meses, durante as longas horas de viagem. O monstro de metal apitava, obrigava os namorados a dar o último beijo antes da separação, e eu não consegui deixar de te olhar nos olhos. Abraçamo-nos amaldiçoando o dia em que decidimos nos ignorar mutuamente, amaldiçoando as estúpidas das frases que não queriamos ter dito um ao outro e amaldiçoando-nos a nós próprios por não termos tido a coragem de resolver tudo mais cedo. Durante largos segundo permanecemos assim, os dois abraçados num abraço forte, fortíssimo, apertado, secalhar até apaixonado, tentando alargar para horas os poucos segundos que ainda nos restavam. Disse-te "Vais ver que é num instante" com uma lágrima mal escondida no olho com a certeza de que te veria partir para longe em breves segundos. Irias afastar-te novamente, lançando-me numa zaragata entre sentimentos e pensamentos próprios. Disseste-me adeus, enquanto corrias para dentro da carruagem para não perderes o comboio que te levava para longe de mim. O comboio trágico que partia calmamente, torturando-me enquanto via a tua mão num gesto de despedida pelo vidro da janela. O monstro de metal esvanecia-se ao fundo, no horizonte, levando-te contigo. Partiste naquela dia para lá do Tejo talvez, mas pior que isso, partiste do meu coração deixando apenas um vazio impossível de ser preenchido.

É ridículo pensarmos que o amor se pode opor à paz. mas no meu caso, assim é. Tinha duas opções à minha frente: ou escolhia a via que continuava a alimentar as esperanças infundadas do coração, mantia o orgulho e aguentava a ideia de que nunca mais poderia voltar a falar-te directamente; ou engolia o orgulho, olhava-te nos olhos e dizia que tudo o que eu queria era ser teu amigo, amigo verdadeiro, aquele com quem tu pudesses ser mesmo honesta, verdadeira, e como única condição, tinha apenas de abdicar do que eu sentia por ti.
É verdade que ainda não te esqueci por completo nem creio ser capaz de tal, mas optei por ser teu amigo a ser teu apaixonado magoado. Estava absolutamente farto de te ver ao longe e não te poder dizer nada. Estava farto de sonhar com o que passou na esperança de volar para um sítio melhor.
O mais engraçado disto tudo foi que agora não me sinto mal. Apenas estranho e consciente da realidade. Agora sei que nunca mais haverá um 'nós' apaixondo, apenas um 'nós' de amizade. Sinto-me apenas estranho por tão repentinamente ter tomado consciência de que todos os meus sonhos contigo acabaram.
Não é bem tristeza, é mais realidade.

Eu preferi a paz ao amor. Que escolha fizeste tu?