domingo, abril 23, 2006

Não é fácil para mim libertar-me da minha própria pessoa.
Torna-se um hábito, quase que nojento, ficar agarrado à minha própria pele com os dentes lupinos cravados nela e as unhas crescidas de um condenado rasgando-a. E era tão mais fácil, tão mais simples tirar a minha pele e colocar a de um qualquer cordeiro.
E esta pele peluda causa-me tantas lágrimas por entre a santa chuva que me cobre os ombros.
Porque é que não consigo abandonar toda esta insegurança e este medo como as pessoas desalmadas fazem com os pobres cães na beira da estrada? Porque deixo que me persigam como se eu fosse um bandido de cabeça a prémio?
Quem me dera despir todo o medo à tua frente, para nunca mais o vestir. Quem me dera conseguir levantar a cabeça confiante para o futuro e mantê-la segura para sempre.
Mas nem tudo o que se vê por fora de mim é vero. Eu escondo sempre que posso e fujo quando me deixam. Sou medroso.
Sou merdoso.
Quem me dera largar esta pele de lobo amedrontado pelos caçadores, que me dera largar a camisa de forças que me mantém isolado na cela do hospício. Porque só posso ser louco se ainda tenho medo sabendo tudo o que sei.
Eu sei tudo o que tu queres que eu saiba. O meu coração sabe tudo o que tu queres que eu saiba. E eu e ele formamos a dupla cobarde que não te merece amar e mesmo assim ama. Ele às vezes tenta confortar-me, diz que a culpa é dele. Diz que ficou marcado e que tem medo de ficar mais marcado. Desculpas. Digo-lhe que nunca o haverás de marcar e ele diz que o sabe perfeitamente. Mas tem o mesmo medo irracional que eu.
Sou estúpido.
Quem me dera não ser eu. Quem me dera ser o Mr. Confiança que tento representar. Esta pele impede-me tanto de ser feliz, nunca o serei enquanto não a conseguir despir. Atormentar-me-á para sempre esta sombra se não me ver livre dela. E tu não tens culpa nenhuma, culpa tenho eu que me deixo atormentar por sombras, por inexistências, por escuridões e por pensamentos quase sanguinários.
Sou culpado.
Sinto-me incapaz de te fazer feliz como gostava, como eu sei que gostavas, simplesmente porque tenho medo de não o conseguir. Simplesmente porque não consigo meter na minha cabeça incapaz que agora sou feliz e o serei enquanto quiser. E porque tenho medo de deixar de o ser, de deixar de te ter.
Sou impotente.
Para me domar, não tenho força. Sou fraco até para arrancar a própria pele. mas vou continuar a tentar. Porque tu mereces que eu o faça. Porque eu mereço que o faça. Porque o sei que seremos mais felizes quando eu o conseguir finalmente. Seremos os mais felizes. E esta é uma missão minha, só eu a irei conseguir. Perdoa-me por teres de assistir a este triste espetáculo, perdoa-me por te fazer sofrer cada vez que dou um murro na minha própria cara e uma facada no meu prório estômago. Perdoa-me.
Sou medroso. Sou merdoso. Sou cobarde. Sou estúpido. Sou culpado. Sou impotente. Mas quero deixar de o ser.
Sou persistente.