quarta-feira, outubro 05, 2005

Transformo-me noutro alguém e corro as ruas calmas, pela calçada, de uma cidade desconhecida para o meu velho eu. Todo o velho é novo para os meus olhos desconhecidos e todo o moderno deu lugar ao antigo. Estou numa cidade estranha, num tempo passado e num corpo emprestado. Os olhos, que não são meus, observam as ruas nostálgicas de um tempo que não vivi. Uma velha carroça quase me atropela, os cavalos assustam-se e ouço o "Hey" do dono gritado por detrás de mim. Não tinha percebido que havia descido o passeio para a estrada calcetada.
Os velhos edifícios em tons de sépia, pelo menos ao ver dos meus olhos emprestados, alinhavam-se numa perfeita simetria de bairro moderno. Plantas nas varandas, roupa estendida nas cordas que uniam prédios, mulheres de casa de braços nús, à janela, cumprimentando quem passava. Senhoras da sociedade passeavam de braço dado com os seus maridos à sombra das sombrinhas. Vendedoras vendiam sem sombra de sombrinhas e sem o braço dos seus maridos.
Voltei abrupta e involuntariamente ao meu eu verdadeiro, ao meu eu eu. Os olhos, os meus entenda-se, ganharam novamente o espectro completo de cores e voltaram a ver a modernidade do seculo XXI espalhada nos ecrãs das largas ruas movimentadas. Esta é a minha cidade. Este é o meu tempo. Este é o meu corpo.
Mas também sentirei falta de ser outro alguém, numa cidade desconhecida, num tempo passado.